O power trio vindo de Bogotá
grava seu primeiro Full Lenght e o Brasil tem o privilégio de ser contemplado
por este lançamento; o selo baiano Abismo, também está debutando, e “Maligno & Essencial” é a primeira
empreitada do nosso Anderson Cachaça, figura bastante conhecida aqui da cena
soteropolitana. A escolha foi perfeita! O Tumulario traz um Black/Thrash Metal
da antiga escola do Metal extremo sul-americano, a versão colombiana dessa escola
já nos deu bandas historicamente importantes como Sargatanas, Agresión e o já
citado Masacre dentre outras. O Tumulario talvez tenha uma crueza que se possa
comparar às duas primeiras; e também certa técnica que não seria equívoco
remeter à derradeira. Ainda assim eu não diria que há uma influência tão direta
dessas três bandas. Morgul (bateria e voz) Abrahel (baixo e segunda voz) e
Tar-Minastir (guitarra e segunda voz) elaboram uma sonoridade bem própria com
rifes expressando fraseados que apontam para o Thrash Metal dos anos 80, só que
numa timbragem tipicamente Black Metal. Os solos surgem em melodias que tiram
nossos sentidos da bagaceira thrasher e nos levam para a tragédia diabólica
blackmetaller. Os vocais também vão na linha do Black Metal com gritos mais
rasgados e soltando o verbo, na maior parte do disco, em espanhol. O baixo traz
alguns graves importantes para o equilíbrio sonoro das composições e a bateria
simples, orgânica, crua é um fator que conecta o Tumulario a algo mais
primitivo e muito bem executado.
No que diz respeito ao
conceito, o trio colombiano divide o trampo em quatro partes: I. O Manifesto: Este é o primeiro
momento, ele abarca as faixas Revelación,
Tumulario e Succubus. A primeira é uma intro que prepara o Headbanger para a
tormenta conceitual que está por vir. Então surge a segunda composição, trazendo
uma definição de identidade para a horda. Tumulario é uma espécie de alma
penada que aqui arrebanha e comanda mortos vestidos em roupas lúgubres para dar
início a um ritual que macula o sagrado erguido pelos inimigos e os sacrifica
no altar. Que bela alegoria, não? O derradeiro tema é a primeira das três
composições que estão em inglês no Álbum. Succubus
é uma entidade diabólica em forma de mulher; nesta composição um homem narra em
primeira pessoa a maneira como foi possuído por essa Diaba! É genial!!! É uma
possessão e ao mesmo tempo uma espécie de estupro porque a Diaba trepa com o eu
lírico na medida em que o sufoca, corta sua pele fazendo-o sangrar e lambe sua
face. Ele a descreve como uma figura infernal, forte e lasciva que toma sua
alma e o transforma num viciado prisioneiro sexual. Fooooda!!!!!
E aí a gente chega no momento II. O Repúdio: Pueblo Apático (Final Premeditado) fala de uma Colômbia mergulhada
na miséria, fala da ganância e indiferença de uma elite escrota e desse “povo
apático” que não reage. Essa não reação é associada ao próximo tema do segundo
momento conceitual que chama-se Idolatria
y Descristianización. Aqui temos a razão de tanta apatia! O domínio através
da cristianização! E agora a pergunta é minha: Como pode haver tanta gente tola
no Metal, defendendo que Black Metal não tem nada a ver com política? Pra não
ter que se posicionar contra o fascismo é mais fácil fingir uma isenção, não é
isso? Mas com o Tumulario não é bem assim e as chibatadas no cristianismo
surgem agressivas logo após a pesada crítica à apatia política do povo.
No momento III. A Maldade, o Tumulario nos convida
a refletir sobre um piromaníaco. Incineración
é uma composição que descreve a loucura incendiária de alguém açoitado pela
modernidade, alguém que sucumbiu diante da laicidade do mundo ocidental moderno
e resolveu transformar a loucura incendiária em seu ritual. Também temos Coven & Stakes (coven e estacas;
segunda faixa em inglês) que vem narrar um ritual selvagem e lésbico, um ritual
orgástico que se assume como preparação para a luta contra um status quo que
oprime as mulheres. É uma declaração de vingança contra a opressão cristã. Após
duas formas de resistências até aqui descritas (uma desvairada, acéfala e outra
mística) temos, então, Represalias
(Verdugo Desatado) que vai nos mostrar justamente o ressentimento, um
sentimento que atira pra onde o nariz aponta, mais uma vingança desvairada, e
vai vitimar quem merece e também quem não merece a dor, vai vitimar inclusive
aquele que se vinga.
E finalmente o momento IV. O Renascer. É chegada a hora de
canalizar as energias e buscar o destino vital: Segundo o Tumulario, sua Arte!
O seu Metal! Isso nos é dito em Esencia
del Ser!! A essência do ser!! Aquela que pode ser pagã ou blasfema,
ritualística (como em Coven & Stakes)
ou simplesmente herético (como em Idolatria
y Descristianización). Esse é o caminho para encontrar a liberdade, é o
caminho até o Eternal Metalhead (Majestic
Comandment). O “Metalhead eterno”, o “majestoso mandamento” é 3ª e última
faixa em inglês, somadas às 7 em espanhol; ela nos encaminha para um lugar
“acima da moralidade”, para “empregar o orgulho”, para “elevar o ser”.
Resistindo, rebelando-se e batendo cabeça até o dia de encarar a porra do
túmulo é que seremos grandiosos!!!
A faixa bônus The Wight’s Chant (El Cantico del Tumulario)
– seria algo como “o cântico da alma penada” – tem uma letra retirada do
poema de J.R.R. Tolkien com adaptação do batera e vocal Morgûl e ampliado pelo
resto da banda. E assim finda o Full Lenght do trio; um trabalho ímpar que
ainda traz uma capa muito foda feita por Felipe Mora. Num colorido lisérgico,
místico e macabro o artista atendeu ao conceito da horda colombiana com extrema
competência, fazendo da capa um outro elemento forte da obra. Alexander Daza
foi o cara do layout; David Tormento e Miguel Angel Osorio foram os
responsáveis pelas fotografias. Trabalho gráfico impressiona, o trampo é em
digipack, o encarte com bastante páginas e ainda vem acompanhado por um poster.
Abismo Metal Store caprichou!! Sebastian Rojas e Tumulario gravaram, mixaram e
masterizaram tudo no Mantra Studios.
No frigir dos ovos a obra
aqui analisada é uma aula do mais verdadeiro e genial niilismo. Sua sonoridade
é áspera, trabalhada dentro de uma dissonância complexa que ao mesmo tempo
trilha por um caminho simples e despretensioso. Desta maneira traz um conceito
forte, arrebatador e totalmente vinculado às bases do underground metálico. É
macabro, forte e inteligente como Héctor Escobar Gutiérrez, Masacre e Fernando
Botero.
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